Menino morreu ao cair de prédio no Recife sob supervisão da patroa, processo criminal conclui que perde sentido expressão “luto atrelado a processo”.
Para aqueles que enfrentaram a morte de um ente querido, é comum ouvir a frase reconfortante: ‘o tempo ajuda a curar as feridas’. No entanto, quando o luto está ligado a um processo criminal sem desfecho, a expressão perde sua eficácia. Mirtes Renata Santana, por exemplo, enxerga o tempo como uma verdadeira ‘tortura’, com as feridas ainda abertas após quatro anos.
Em meio a esse cenário de dor e saudade, lidar com o falecimento de alguém próximo se torna ainda mais desafiador. O passamento de um ente querido em circunstâncias obscuras pode deixar marcas profundas na alma, tornando a busca por justiça um caminho árduo e doloroso. É preciso encontrar forças para seguir em frente, mesmo diante da ausência e da incerteza que a morte deixou em seu rastro.
Tragédia e Luto: Morte de Miguel Otávio e o Processo Criminal
No fatídico dia 2 de junho de 2020, Mirtes se deparou com a cena devastadora de seu filho, Miguel Otávio Santana da Silva, de apenas 5 anos, gravemente ferido após uma queda de 35 metros. O pequeno foi prontamente socorrido, porém não resistiu e veio a óbito. A mãe, uma empregada doméstica, levou Miguel ao trabalho devido ao fechamento da creche, em meio à pandemia da Covid-19, sem opções para deixá-lo em segurança.
O governo de Pernambuco havia categorizado o trabalho doméstico como não essencial, mas Mirtes se viu obrigada a manter sua rotina para não perder o emprego. Em um trágico desdobramento, ela foi incumbida de cuidar do filho da patroa Sarí Mariana Costa Gaspar Corte Real, residente em um luxuoso prédio no centro do Recife. Enquanto Sarí se ocupava em casa, Miguel, sozinho, acabou em uma área perigosa, acessando uma janela que resultou em sua morte.
Em maio de 2022, Sarí foi sentenciada a oito anos e meio de prisão por abandono de incapaz com desfecho fatal. Contudo, permanece em liberdade até o momento, enquanto Mirtes batalha incansavelmente pela conclusão do caso na Justiça. A espera por justiça tem sido um processo doloroso e exaustivo para ela, que enfrenta reviravoltas desfavoráveis nas decisões judiciais.
Recentemente, a Justiça do Trabalho em Pernambuco reduziu a indenização devida por Sarí e seu marido, Sergio Hacker, de R$ 2 milhões para R$ 1 milhão à família de Miguel. Em novembro do ano anterior, o Tribunal de Justiça de Pernambuco diminuiu a pena de Sarí para sete anos de prisão, com possibilidade de recursos no TJPE, STJ e STF.
Atualmente, Mirtes divide seu tempo entre suas atividades profissionais, acadêmicas e engajamento em movimentos antirracistas. Em uma entrevista à Agência Brasil, ela destacou a demora no desfecho do caso, expressando sua visão de que a questão da morte de Miguel e a morosidade da Justiça estão intrinsecamente ligadas ao racismo estrutural.
Ao refletir sobre a redução da indenização, Mirtes revelou que, embora esperasse uma diminuição, a abrupta redução pela metade a surpreendeu. Ela enfatizou que seu foco principal está no processo penal, e qualquer valor que seja determinado para pagamento é secundário diante da busca por justiça. A luta de Mirtes continua, permeada pela dor da perda de seu filho e pela batalha por justiça em um sistema que, para ela, muitas vezes perde o sentido quando se trata de vidas negras.
Fonte: @ Agencia Brasil
Comentários sobre este artigo